Após um semestre burocrático,
envolvidos em produção de planos, inscrição em festivais, aprovação de dois projetos
no SALIC, catalogação de acervo, adequação de arquivo, e outros tantos males
necessários para o desenvolvimento da Pequena Companhia de Teatro, eis que
retomaremos nossas atividades artísticas a partir da ocupação do Centro Cultural
Banco do Nordeste de Sousa/PB.
Sim, perdemos (ou ganhamos) um
semestre cuidando de burocracia. Semestre atípico, mas necessário. A
pluralidade e diversidade das nossas atividades impossibilitam que a Katia
(nossa produtora) seja a única responsável por esses afazeres. Com isso, um
tempo criativo valioso é despedido para que a máquina funcione. Por incrível
que pareça, não me desagradam essas ocupações – fugindo do imaginário de que
artistas são arredios a papeladas, mas não morro de amores por elas.
(Abro um parêntese para falar de um
comentário sobre a minha postagem Lei Rouanet ou a diferente lógica de um artista, quando uma leitora carioca dizia não concordar que a gente fizesse de
tudo, não aceitar que cada um dos membros da Pequena Companhia de Teatro
tivesse várias funções, que isso não era bom porque desvalorizava o artista,
que melhor seria se cada um de nós exercesse apenas uma função, que, que, que. Percebe-se
que o sudeste não conhece o “resto” do Brasil, e arremato: ninguém conhece a
realidade de uma companhia de teatro maranhense a não ser uma companhia de
teatro maranhense. Fecho o parêntese pedindo o seu esforço para reatar o fio da
meada.).
O que levanto aqui é a necessidade de
projetar, a importância de programar, mas, principalmente, o fundamental que é
desenvolver uma visão estratégica para além do horizonte cercano, como já falei
aqui. Como artistas que somos, precisamos entender nosso entorno, para podermos
projetar uma vida de arte em um mundo em que a arte não faz parte da vida.
Esse paradigma exige de nós um olhar
menos romantizado (difícil para um romântico inveterado como eu) pelo menos por
um quarto do ano produtivo. Afastar-se da cena, do poema, do cinema, do fonema,
e ocupar-se do problema, do dilema, da Caema, do esquema; porque ninguém pode
entender o que queremos com o nosso fazer artístico a não ser nós mesmos. Digo,
não podemos repassar nosso futuro artístico para um tecnocrata, sob pena de
encontrarmo-nos na jaula de um leão, com um banquinho e um açoite, sem ter
feito a “oficina” de adestração.
Mas como dimensionar tempo artístico e
tempo técnico? Como saber se não deixei de ser artista e nem percebi? Como
escapar da ardilosa armadilha burocrática sem arranhões?
Penso (apesar de saber que, como diria João Grilo, todo penso
é torto) que a arte não se esmaga. O artista não se rende. O sistema jamais
conseguirá vergar um artista de verdade. Se a vida lhe tragou, você jamais foi
artista. Se você teve que largar a arte para cuidar da produção, sua vida
sempre foi produzir, e isso não é demérito, é reconhecimento. Mas, se você é
artista e tem que ralar para conseguir fazer sua arte acontecer, não se aflija,
você poderá penar, se lascar, se endividar, se rejuntar, mas o artista
permanecerá intacto, pese ao esforço do sistema em aniquilar sua arte. Não vejo
como possível o esvaziamento artístico em prol de um atarefamento burocrático.
No momento exato o artista explode, retoma, inicia, professa. Se você é artista e teme estar cambaleando
pela roleta do sistema, insisto: não se aflija. O impulso artístico organiza
isso para você. Do contrário, sinta-se livre, você nunca foi artista.
2 comentários:
Deve haver poesia na papelada também... ;)
(Risos) poesia pura!
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