quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Breviário

Sem computador, sem conexão, sem lenço, sem documentos, sem viagens e com um tempo imenso para elaborar projetos. Época de plantar, fazer a cama. A galáxia tem seu próprio ritmo. Eu tenho o meu. Tudo está se configurando para a continuidade de um projeto que se estabelece cotidianamente. Algumas coisas se recuperam, outras apodrecem. Gosto disso. Perceber que não somos capazes de dar conta de toda a demanda - entendam como a obrigatoriedade de produzir, sempre. Nada mata ninguém - nem a morte. Tudo é ilusão e invenção. Quanto ao teatro, ele existe por si só; ele se sustenta - contradizendo e contrariando os acadêmicos e intelectuais plantonistas. 
 
Hoje brindamos na nova sede. Amanhã, faremos a dança da chuva. Ela se presentificou pouco essa noite.
 
No próximo mês voltamos a circular com Pai & Filho. O ano está moroso, como os dias que se seguem. Na próxima semana uma postagem mais digna e consistente.

domingo, 26 de agosto de 2012

A difícil jornada


A dramaturgia é um exercício precioso para o encenador – quando é apenas exercício. Quando é ofício, aí complica. Escrever para encenar limita o autor e amarra o encenador. É uma peleja seca e sacra. O escritor precisa pensar no diretor. O diretor precisa ter coragem para aceitar o escritor – aguentando os desafios e provocações oferecidas pela escritura. Esquizofrenia pura. Eles querem o mesmo, porém, pensam diferente. Se um é anárquico o outro é austero. O dramaturgo radical precisa dar espaço para façanhas menos íngremes, sob pena de ver o responsável pela cena preso num beco sem saída. Contudo, um e outro, não podem se acovardar com marolas e devem ter a coragem de enfrentar o alto-mar. Se um é polêmico o outro é político. Quando o encenador grita o poeta deve ter a força para calar. Entre opostos e atravessados vão, um e outro, sem medo de ferir. Escrever e encenar. Verbos forjados em mim, separados. Juntos são mera consequência.  Confidências de um bardo. Afinal, vocês sabem, velhos caem do céu como canivetes e não há guarda-chuva ou estiagem capaz de pará-los.

sábado, 18 de agosto de 2012

Fim da 3ª Jornada


Belo Horizonte, 14 de agosto, 00:27 AM.
Em São Paulo, a última apresentação trouxe a agradável companhia da dulcíssima amiga Flávia Teixeira. Com ela, a abertura do debate – aqueles corriqueiros primeiros minutos de silêncio constrangedor, até que a confiança aparece e o espectador se derrama em análises, observações, comentários e revelações pessoais. Desmontagem finda e o papo com o querido Armando para tirar o atraso de alguns anos sem nos ver. Dia dos pais e outro Prato da Boa Lembrança. Manhã vinda, e Maria Estela, nosso anjo da guarda, nos alcança até o aeroporto. Já em Belo Horizonte, a recepção de Patrícia, almoço, mercado central (outro para nossa coleção), e a noite termina com um jantar inesquecível com a figuraça do Zé Carlos, tio de Jorge, prosador de primeira. Amanhã Pai & Filho e sua 84ª apresentação.

Brasília, 15 de agosto, 10:57 AM.

Uma plateia divina! Casa lotada, público generoso, atento, disposto – uma das melhores relações que o espetáculo teve com o espectador. Longo debate – todos eles são – e a dúvida: às vezes tenho a impressão de que o debate entedia o espectador, mas, como continuam ali, perguntando, não vejo razão para parar (risos). No dia, a montagem e o almoço formidável com Zé Carlos e Shirley, em uma tarde que pressagiava a bela noite por vir. No fim, outro prato, outro Chopp, outro papo, outra cama. Agora, no aeroporto de Brasília, à espera do embarque para São Luís.


São Luís, 18 de agosto, 10:48 PM.

A 3ª Jornada do Palco Giratório nos apresentou uma realidade muito diferente da nossa. Sessões esgotadas desde o início de mês em São Paulo, superlotação – com gente sentada no chão – em Belo Horizonte e mais de oitenta pessoas em Curitiba. Nos três casos, o espectador não fazia ideia de quem éramos. Como transformar a fruição de teatro em habito? Como desabitar a sala da TV? Como povoar as casas de espetáculos? Na discussão de ontem, com Katia, Jorge e André, a educação foi consenso. Contudo, ainda reflito sobre a qualidade do vem sendo produzido em nosso estado nas últimas décadas.  Creio que o bom espetáculo robustece o habito do espectador. Há quanto tempos não vemos uma peça arrebatadora? A peleja do artista deveria ser contra a mediocridade.

domingo, 12 de agosto de 2012

Terceira Jornada – Curitiba, São Paulo e BH


Curitiba, 08 de agosto, 23:35 PM.

Chegamos a Curitiba para o início da 3ª etapa do Palco Giratório. A cidade traz a inevitável lembrança das andanças pelas ruas com os queridos amigos d’A Máscara, quando nos apresentamos aqui com Deus Danado – duas apresentações e muitos frutos. Hoje, mercado, almoço, olimpíadas, descanso e uma reflexão: apesar de nascer em uma família peregrina – não só este é o primeiro nome da minha mãe, como aos dez anos saiamos de Buenos Aires para Balsas, no interior do Maranhão – noventa por cento de todas as viagens que fiz na vida (e foram muitas) foi o teatro que me proporcionou, ponto para o teatro. Amanhã, montagem, apresentação, debate e desmontagem.


Curitiba, 10 de agosto, 06:54 AM.

Dia corrido. Montagem um pouco mais complicada e demorada do que o previsto, compensada com uma apresentação redonda. Longo debate para temas curiosos: perfil dos idosos de hoje; corte e costura; referências a Tempo de Espera.  Comentários sobre a montagem de Aldo são recorrentes, trazendo um alerta: se a única referência maranhense continua sendo a de quarenta anos atrás, não deveríamos fazer uma avalição sobre a qualidade da nossa produção? Depois da desmontagem, o melhor do dia, Eisbein e Sub Osborne (joelho de porco, chucrute, salsicha e Chopp). Agora, no aeroporto, com pouquíssimas horas de sono, esperamos o voo para Sampa.


São Paulo, 11 de agosto, 00:16 AM.

Nada é tão ruim que não possa piorar. Dia confuso, com cancelamento de voo, atrasos, sono, longa espera por taxis e uma montagem mais complicada do que a anterior. Como hoje não teve espetáculo, o dia caótico prenuncia um excelente dia amanhã, quando da primeira apresentação de Pai & Filho no SESC Pinheiros. Dia salvo por um Zepelim – agradável pub na Vila Madalena. Vou dormir.


São Paulo, 12 de agosto, 14:09 PM.

E o excelente dia veio. Uma apresentação contundente em um espaço que favoreceu o desgaste e o envelhecimento da cena. Antes, uma passada no Mercado Municipal (tradicionais sanduiche de mortadela e bolinho de bacalhau), depois, o encontro com os queridos amigos d’A Outra – bom papo para matar a saudades. Hoje tem mais, última apresentação em São Paulo e, amanhã, BH. Notícias sobre o fim da jornada ficam para depois, porque hoje é meu dia de postar.

domingo, 5 de agosto de 2012

Cogito, ergo surto.


Em resposta à postagem sobre o Teatro Polidramático, Kil Abreu, amigo da companhia, disse: “Sinceramente, quando vejo o trabalho de vocês não penso que aquilo é uma “dramaturgia do ator”, ou dramaturgia do espaço ou etc. Penso que é um espetáculo de teatro feito com muito rigor (de atuação, e também no plano visual, etc.), que me traz uma série de questões na minha relação com o mundo. Esse rigor formal não é um valor em si, ele é parte da estrutura de pensamento do espetáculo, porque se traduz como forma e nós só podemos ler através da forma, não há saída. Então, uma parte boa do significado está nessa simetria rigorosa que o espetáculo tem, que não é apenas um atestado de rendimento técnico da Pequena companhia, senão vira formalismo. É condição para que possamos ler uma determinada fábula na visão de mundo de dois artistas, e esta visão de mundo se traduz melhor naquele arranjo formal, com aquelas características de composição.”

De fato. Contudo, o comentário aguçou minha análise e continuo refletindo a respeito. É a necessidade de entender, em melhores termos, a relação do nosso fazer com o espectador – aquele com quem compartimos a coautoria do nosso processo. Essa busca de clareza vem a reboque da nova montagem que começa a germinar. Tentando fazer a defesa do Teatro Polidramático para mim mesmo, pensava: se tomássemos uma das variáveis auxiliares do “poli-”, o cenário, e pegássemos dois atores escravos, vestidos de preto, invisíveis de representação, e se encarregassem da reprodução do movimento. Acompanhando apenas o desenvolvimento do cenário, sua movimentação e continuidade, teríamos dramaturgia? Não haveria uma construção temporal do dizer? Uma evolução do tempo-espaço dona de discurso, que não se bastaria em si, mas diria dessa fábula? Ela é auxiliar, não capital como a dramaturgia do ator do encenador ou do autor, que fundamenta a narrativa, mas está contida de significado sequencialmente ordenador dessa fábula, acho. É nessa perspectiva que vejo como os diferentes instrumentos dramatúrgicos congruem para o dito final. Mas, no fundo, acho que meu discurso busca apenas o reconhecimento dos diferentes instrumentos de significação que usamos para construir esse dizer – o que não deixa de ser uma grande bobagem porque eles nunca foram desconsiderados, nem por nós nem pelo público (risos). São só conjecturas que democratizo. Difícil é encontrar alguém interessado em lê-las (risos, de novo).

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Completude?

Há tempos que determino, sentencio minha permanência no teatro. Nasci com o cu para a lua e, a cada segundo de esperança de vida, a percepção de que nada é completo, e por tabela não nos completa, é definitivamente o que me toca profundamente. Essa instabilidade das emoções, dos conflitos é insuportavelmente prazeroso. Quando revolvo meus papeis, anotações, fotos, livros e textos, me exponho por completo: muita coisa ainda a fazer e nenhum obstáculo a não ser o tempo. Mas, sou forjado no planejamento estratégico e, como diz minha mãe, não há possibilidade de dar ponto sem nó. É que navegar em águas profundas exige ao menos um pouquinho de coragem... ou de insanidade. Esse teatro, não só me seduz, como também seduz meus horizontes. Há pureza somente nas ideias. Híbrido. Teatro de grupo pode ser cartesiano. Mas, o artista... esse possivelmente não.