Eu sou ator. Escrevi um texto teatral (não há drama; não há essa intenção). É o segundo, acho. Compartilho.
O ASNO, A CARROÇA E O LONGE
Personagens:
Homem
Mulher
O tempo
O tempo: Se me tens como inimigo, perceberás que a guerra estabelecida não será por mim instituída. Digladiar é para os fortes, assim como a morte está para os fracos filhos de Eva.
Mulher: Tomas a mim, mortal insepulta, como todas de minha espécie. Para de sussurrar a decomposição de si por sobre aqueles que jamais, jamais serão seus aliados.
Homem: Amigo, pousa sobre mim a sua mão. Faça-se aliado dos que buscam a esperança abissal de um esquálido aspargo cultivando em terra infértil. Mate a seiva fácil.
O tempo: Abraço o sim tanto quanto o não é rejeitado. Se calo é porque a sujeição vem funérea e natimorta passível de devorar, incomensuravelmente, o livro das horas. Negue-se à escrita e feneça.
Mulher: Não concebo a guerra de nervos nem a paz coloquial de fétida boca indigesta. Degluto a saliva no vento e giro ponteiros neutralizados pela dor de um hiato submisso.
Homem: Sinto-me confuso entre a retidão da linfa que se mostra e o sangue que ferve em seu esconderijo labiríntico. Minha angústia, mulher, é perceber-me no tempo.
O tempo: Apaguem as lembranças, desacreditem nas projeções, parem de respirar e sintam a fortaleza e a agonia dos ponteiros. Entreguem o pó ao vento e a carne, putrefata, aos vermes. Não tenho domínio de mim.
Mulher: Sou, enfim, liberta de ti. Devoram sofregamente minha seiva e repercute, em mim, a troca natural das cinzas e do pó. Diluo-o no outro que me consome.
Homem: Quero refletir o que fui, debruçar sobre ti as agruras do mundo, sentir a carícia tempestuosa do vento e ver, reflexo no espelho, os olhos da multidão perdida em vasto tempo; sentencio-me em tuas linhas meu encanto.
Fim
Um comentário:
A "esquete" da pequena cia.
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