O futebol me abandonou, a arte não. No
início da década de noventa eu viajava para Araguaína/TO com uma caixa de
livros, entre eles a prosa completa de Borges – presente que me acompanha desde
1987 –, para dividir uma república com jogadores de um time de futebol cujo
nome minha memória se ocupou de não reter. Nesse então, morando em Balsas, era
atleta e artista simultaneamente, fazendo teatro, música e literatura, há
alguns anos. A rotina de artista, em Balsas, me fazia ensaiar até às quatro da
manhã. A mudança para uma rotina exclusivamente
atlética, em Araguaína, me fazia madrugar às cinco da manhã, para treinar. O
despertador escolhido pelos meus companheiros era um som sintonizado na rádio
local que gritava: eu não vou negar que sou louco por você! Acredite. Deixe
sair aquele sutil sorriso no canto da boca: sim, também tive o sonho de ser
jogador de futebol. Não me pergunte por que motivo, mas este era o meu
principal desejo. Não durou muito, ou seja, o teatro que faço é consequência do
meu maior fracasso. Recentemente, na plateia de Velhos caem do céu como canivetes, um espectador comentava: só conhecia você como o argentino,
cabeludo, bom de bola. Além de estufar meu peito, o fato serviu para confirmar
meus predicados futebolísticos para minha companheira – sempre reticente com
minhas possíveis fabulações sobre o passado. Sim, eu era bom. Considero-me melhor
jogador no passado do que sou encenador no presente – se isso quer dizer alguma
coisa. Por isso, não saberia apontar por que não sou um jogador aposentado.
Talvez a aleatoriedade defendida pelo Ser Humano, personagem do nosso último
espetáculo, seja a única maneira de explicar o encenador de hoje. A
aleatoriedade como que minha vida e trajetória foram constituídas é digna de
nota... O gordo prólogo que aqui escrevo só existe para tentar explicar a
sentença que motiva esta postagem: não acompanharia sessenta e quatro peças de
teatro em um mês de festival, mas assistirei aos sessenta e quatro jogos da
copa sem o menor constrangimento. Mas, como sou uma ficção, não dê muito
crédito às anedotas que constroem o roteiro da minha vida. Y dale!
Assinar:
Postar comentários (Atom)
8 comentários:
Massa! Fico feliz!
Excelente texto.
Obrigado, André, Jacqueline! Apareçam mais vezes! Saudades!
Top!
Rapaz, que drible hein, Marcelo "caixinha de surpresas" Flecha?! Além de argentino cabeludo, bom de bola.
Rapaz, por essa eu não esperava... Marcelo Surpreendente Flecha, hein?
Adoro ler relatos. Os caminhos que nos formam...
É, meus amigos... futebol é uma caixinha de surpresas, a vida também.
Postar um comentário