Próximo a completar 8 anos
em cartaz, o espetáculo Pai & Filho se encontra em curta temporada aqui na
sede da Pequena Companhia de Teatro (Rua do Giz, 295, Centro), ontem, hoje e
amanhã (sábado, domingo e segunda), às 19h, com uma série de peculiaridades que
servirão como fio condutor das micro-reflexões fragmentadas que me proponho
na postagem de hoje.
A primeira peculiaridade
atravessa a política de preços da Pequena Companhia de Teatro. Depois de quase
uma década em cartaz, e 25 apresentações em São Luís, ontem foi a primeira vez
que cobramos ingresso para assistir ao espetáculo. Como o nosso posicionamento
político assegura a gratuidade de qualquer atividade da Pequena quando for
subsidiada com recursos públicos, fica manifesta a aridez de políticas públicas
culturais pela qual passa o teatro de grupo do país, e percebemos claramente o
quanto essa gratuidade contribuiu para aproximar um público com menor
elasticidade orçamentária e, por consequência, que não tem o teatro como
hábito. É fácil dizer que tem que cobrar, mas qualquer apreciador de teatro,
que cresceu na labuta diária pela sobrevivência, sabe o que é ser privado daquela
experiência artística única porque não tem o vintém que separa o quero do posso.
Desta feita, o vintém corresponde ao valor de R$ 20,00.
Também é a plateia,
peculiarmente, a estrela desta temporada. Na apresentação de ontem conhecemos o
espectador de número 10.000! Nilson Carlos Costa, é o nome dele. Levando em conta que
o espetáculo Pai & Filho foi apresentado majoritariamente com plateias
reduzidas, esse é um número a se comemorar. Para atingir essa quantia, o
espetáculo precisou se apresentar 148 vezes, em 62 cidades de 22 estados do
Brasil. Um fato desses não podia passar incólume, e o sortudo ganhou um
certificado que dá direito vitalício à gratuidade de acesso a qualquer
atividade da Pequena Companhia de Teatro, além de um espumante que nos custou o
borderô dos três dias de apresentações. A anedota me serve para ilustrar o
pensamento primordial do nosso grupo. Não fosse o entendimento da necessidade
de nacionalização da Pequena Companhia de Teatro, seria impossível chegar a
essa plateia, pois a demanda local por um teatro focado em uma pesquisa de
linguagem com menor diálogo como o mercado não possibilitaria atingir esse
número de espectadores. Sempre trabalhamos com esse propósito, e durante toda
a nossa existência como grupo, procuramos estabelecer o maior diálogo possível
com o país, independentemente de projetos custeados, como no caso recente da
nossa ida a Mossoró e Natal com o espetáculo Velhos caem do céu como canivetes.
É o diálogo com os grupos de teatro do Brasil que assegura a nossa
sobrevivência.
Seguindo com a relação de
peculiaridades desta emblemática temporada, é a primeira vez que uma
apresentação de Pai & Filho, em São Luís, não tem nenhuma relação com algum
tipo de projeto que a companhia esteja desenvolvendo, a não ser o de manutenção
independente. O espetáculo – que foi o primeiro do Maranhão a participar do SESC Palco
Giratório – sempre esteve referendado pelos principais editais, prêmios, projetos
e programas do país; e assim, ocupamos o Centro Cultural BNB, em Sousa/PB,
participamos do Viagem Teatral, do SESI, circulamos pelo Programa Petrobras
Distribuidora de Cultura, e ganhamos dois Prêmios FUNARTE de Teatro Myriam
Muniz – estes, responsáveis pelo maior número de apresentação do espetáculo em
São Luís. Essa realidade diz muito do questionamento levantado no segundo
parágrafo desta postagem: em tempos de escassez, cortes de verbas,
privatização, contingenciamento, mercado, estado mínimo, e toda a sorte de
palavras do dicionário neoliberal, a constatação de uma aguda desidratação do
teatro de grupo é a prova do eficiente mecanismo de desmonte cultural iniciado
recentemente. Com política, sem política, você ainda pode nos assistir hoje e
amanhã.
Pai & Filho também
concentra 6 Prêmios SATED/MA de Artes Cênicas, nas categorias de Melhor Ator,
Diretor, Espetáculo, Produção, Cenário e Figurino. Esse prêmio, tão criticado
pela classe, me sugere uma sentença que deve transitar pelo imaginário teatral
da cidade: ter prêmio SATED ou não ter, eis a questão. Penso que o prêmio nunca
atingiu a potência que poderia ter, como instrumento de celebração anual, como
momento de encontro, como reconhecimento dos esforços de produção de uma
classe, contudo, o desaparecimento deste supera todas as carências que a sua
existência apresentava? Digo, com a extensão do prêmio, ganhamos ou perdemos? Às
vezes, quando a crítica não se faz reflexivamente, pode apresentar resultados que
não são os mais saudáveis, e o poder desta pode ser devastador. Não estou certo
se as críticas que fiz ao prêmio contribuíram para o amadurecimento do
movimento teatral maranhense, mas tenho certeza que colaboraram para a extinção
do prêmio. Foi o melhor fim?
E para encerrar o desfile de
peculiaridades da curta temporada de Pai & Filho, que abre nosso calendário
de atividades para 2018, não poderia deixar de falar do espetáculo em si. Venha
ver. Vale a pena ver atores como Cláudio Marconcine e Jorge Choairy. Depois de
oito anos em cartaz, vale a pena ver o quanto essas personagens se apropriaram
da cena, o quão integro está o vigor e o frescor da ação; vale a pena ver o
quanto um espetáculo vive, amadurece e se transforma com o tempo, mesmo que não
se mude uma vírgula.
5 comentários:
Bem aventurado o espectador 10.000...
Não vou mentir, tive inveja do ganhador do certificado vitalício!
Viva ao teatro e um VIVA a Pequena/Media/Grande companhia de Teatro!
Maravilha!
Li mais um dos teus textos. Comentei mais uma vez. Já foram 10 mil? Cadê meu vinho?
Querida Perla, e queridos André, Igor e Gilberto! Leitores frequentes como vocês devias ter brindes, também!
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