Creio que
pela idade que me distancia destas, algumas pessoas me chamam de professor. Não
sou professor, não tenho licenciatura. Nem, ao menos, curso superior. Tampouco
sou intelectual, como arriscam outros mais despudorados e gentis. Me considero
um pensador. Penso. Não pensasse, rastejaria. Pensador como você, que pensa por
que estou a elucubrar sobre este assunto. Trato-o em defesa do pensamento. Em
defesa da presença do pensamento no teatro. Em defesa da reflexão. As recentes
experiências sensórias, fragmentadas, desconstruídas, processuais, performateatrais,
pós-qualquer-coisa, estão extinguindo o pensamento. Pensar não é mais uma
condição basilar para a fruição de teatro. A relação do espectador com a
fortuna polissêmica e polifônica contemporânea pode ser a de “um jegue olhando
para um castelo”, como diria o velho Adelmo. Basta contemplar o incompreensível
e se assombrar com a magnitude sensória daquilo que nada contém. Nem pensamento
nem sentimento. Espectador que sou, estão me subtraindo o direito de pensar, e me
coagindo a um sentir não emocional; a um sentir tátil, olfativo, gustativo, esteticovisual,
ruidossonoro. A contemporaneidade não tem esse direito. Quando me percebo
partícipe do fetiche ególatra de algum neoteatrista – ao espectar outras das
tantas experiências modernoarcaicas – a única sensação que emana do meu corpo é
o calor provocado pela ira. Me ofende participar desse joguinho pseudovanguardista.
Me ofende a presunção de acharem que conseguem camuflar o engodo. Me ofende que subestimem
minha inteligência ao recriar o famigerado clichê do choque. Me ofende a
subtração do meu pensar. Já a pecha de antiquado-careta-retrógrado-velho que
começa a se desenhar no pensamento de alguns amigos, durante a leitura deste
artigo, fazendo surgir aquele risinho no canto da boca, não me ofende, me
defende. Porque não renego minha história nem a história da humanidade. Foi a
soma do meu quase meio século de vida, construído a partir do exercício do
pensamento, que me trouxe até aqui. Que me possibilita separar arte de
artistice. Por isso reitero: o estupro ao pensamento deve parar. Parará, com as
décadas. Lamento que, até lá, nosso cérebro já não esteja apto para o pensamento,
e sim, embrutecido pelo instinto sensório peculiar a qualquer animal da fauna
terrestre.
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6 comentários:
Ainda assim, Professe: o seu fazer, o seu pensar... - Há quem aprenda com eles e nem sempre (nunca) esta será uma escolha exclusivamente sua. Como dizem, Jesus não era cristão, Buda não era budista e assim por diante! Malditos rótulos, rs. Louvável texto!
Marcelinho, menino. Quero falar contigo. Estão querendo me forçar a ter opinião, mas para mim os domingos são dias santos, de santa preguiça. rs
Grande, Jacqueline! Com achar quem leia já estou satisfeito! E tu, André, opine moço!
Putz, agora vou ter que ler e comentar esse blog pra você fazer o mesmo no meu!!!! Rsrs...
Camarada, errada está a formalidade boçal que define quem é merecedor de qual título. Tanto é que muitos médicos não são doutores, no entanto...
Pela tua lógica de ser pensador, não tenha dúvida que você também é professor e intelectual, ainda que fique entusiasmado com as aulas de Excel!!! Rsrs...
Grande abraço, camarada! Saudades!
Salve, Fernando! Isso é uma permuta justa! Estarei lá! (Gargalhadas) Só os alimentadores de blog entenderão!
Da música ao teatro, parece deliciosamente arriscado tomar um gole de um "eterno-presente-de-sensações-não-pensáveis-até-para-não-serem-perdidas-em-
meio-às-reflexões-intelectualizantes-que-podem-espatar-a-vibe", do lado daqui, sentado na platéia.
Do lado de lá, não pensar seria mesmo uma forma de não dar o braço a torcer para o poder da linguagem? Nem para os poderes instituídos na/pela arte a partir do uso canônico das linguagens? As técnicas seriam uma camisa de força opressora contra a criatividade? Então, o que liberta? A não-linguagem é livre?
Os artistas têm seus caminhos possíveis, mas seria possível também incluir nessa conversa o pensamento como um artesanato? O artesanato intelectual?
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