Amanhã viajo para Teresina,
facilitar uma oficina de escrita dramatúrgica pelo projeto SESC Dramaturgias,
última cidade que visitarei este ano provocando dramaturgos, após ter passado
por Caxias/MA, Vitória/ES e Maceió/AL, pelo mesmo projeto. Antes, já estive em Teresina
para participar do NORTEA/Encontro de Pesquisadores do Nordeste, dentro do
FestLuso; antes, pelo SESC Amazônia das Artes, com Velhos caem do céu como canivetes; antes, com Pai & Filho, pelo Myriam Muniz de Teatro; antes, para
ver a estreia de “Quando as máquinas param”, do Harém; antes, com Deus Danado,
participando de outra edição do FestLuso; antes, com “Ramandá e Rudá”, no Theatro
4 de Setembro; e antes, e antes, e antes de antes. Uma intrínseca relação com a
cidade, construída através do teatro.
O teatro tem isso de
admirável. Nos faz erguer pontes espontâneas onde nenhum outro instrumento de
engenharia consegue erigir. Somos levados pela força do seu desacato, e vamos
rompendo barreiras, ramificando sonhos, reconhecendo identidades, revendo amigos;
porém, a principal virtude do seu vigor contraventor é nos fazer confrontar a estática, desafiar a inércia, combater a letargia, sempre na expectativa de um
novo ou surpreendente porto – porque o novo pode vir da surpresa de nos levar
novamente a um lugar querido.
Agora, pelo poder da palavra
escrita, meu encontro com pessoas que desejam dialogar sobre formas,
metodologias e ferramentas dramatológicas; sempre na torcida de construir novas
pontes, fazer novos enlaces, tecer novas teias; pois, a mais potente prova da
natureza profícua do teatro é que provavelmente não encontre nenhum amigo ou parceiro
antigo participando da atividade. Claro que abraçarei todos nos momentos de
folga, mas o teatro não só promove reencontros, como auspicia novos encontros,
com pessoas que não se conhecem, mas se reúnem em torno de um objetivo comum,
neste caso, escrever para teatro.
Se você tiver curiosidade,
já versei muito sobre minha experiência nesta empreitada dramatúrgica, basta
clicar aqui para aprofundar a leitura; mas um ponto que pouco abordei nas
postagens anteriores diz respeito a esse frescor presente em cada encontro;
essa curiosa química que faz com que diferentes se juntem para tratar de algo
que os atrai. Logo, o teatro tem um poder de socialização incomum, promovido
pelo tête-à-tête, pelo corpo-a-corpo, pelo enredamento de seres díspares em
torno de desejos comuns.
Não fosse o teatro eu seria
um anacoreta. O meu leque de relações sociais se resumiria a um entorno tão
restrito que não sei se poderia ser enquadrado como um estado de sociabilidade.
A reserva promovida pelo meu fastio em lidar com pessoas teria me transformado
em um homem das cavernas – homem que minha querida amiga Tony Silva costuma
contar que eu era quando nos conhecemos. O teatro socializando a besta, ou o
besta. De besta, mesmo; metido, antipático, presunçoso, pernóstico, arrogante.
Ah, o teatro! Somente nesta
ação, a oficina Do narrativo ao dramático: a transposição de gêneros como instrumento de confecção de dramaturgias, promovida pelo SESC, conheci mais de
cinquenta pessoas; e dessas tantas com as quais mantive um intenso diálogo e
frutuoso aprendizado, algumas reverberam até hoje; não mais no campo de um
grupo de pessoas que participaram de uma atividade formativa, mas de
companheiros de dúvidas, parceiros de conversas, colegas de ruína, consortes
para a vida.
É o teatro aproximando as pessoas
e nos lembrando que precisamos do contato presencial entre as gentes para que o
próprio teatro sobreviva. Teresina, aqui vou eu!
6 comentários:
O poder humanizador da prática artística! Da prática que busca satisfazer uma necessidade que não apenas a vaidade. Ela exerce esse efeito de levantar os abestados de sua ignorancia e fazer os bestas descerem de seus patamares para uma comunhão. A arte é uma das grandes produções humanas! Humana, demasiadamente!
Já que nos deste a liberdade: Desce do salto Flecha! Rsrsrs
(Risos) O problema de descer do salto, meu caro amigo Rodrigo, é ter que confrontar a minha mediocridade. Apareça!
São tantas coisas Marcelo e ainda dizem que o cultura está numa pior. Pode estar, mas os "colegas de ruínas" são um tanto subversivos e desafiam o postulado da não comunicação e se arriscam nesta prática que nos torna bestas mesmo, que é o fazer teatral, guiados no escuro por uma crença real mas que ninguém assegura; nem mesmo os deuses. Abraço e obrigado pelo convívio e pelo aprendizado constante, recíproco.
Caro Marcelo, besta realmente sou eu em não parar meu mundo frio e lógico e correr para o teu teatral e com o qual me encontro a cada leitura dos teus dias... quem o lê sente esse frescor convidativo da palavra...
Creio que não era a intenção, mas ao ti ler hoje finalmente vi um sentido para aderir às redes sociais e a este espaço: "... diferentes se juntem para tratar de algo que os atrai.."
Sigo grata pela oportunidade que me deu hoje; siga nessa viagem para mais um projeto SESC feliz e ciente da tua contribuição e alcance.
Como colegas de ruína, continuaremos sempre, amigo, combatendo a inércia! É sempre bom tê-lo do outro lado de um texto escrito aqui! Apareça sempre!
Amiga, Luciana! Minha guru contábil, musa dos números e impostos! Seu depoimento é a prova cabal de que escrever inutilidades aqui faz algum sentido! Apareça sempre!
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