Tenho
ouvido tanta necedade a respeito de cultura, ministério, arte, Lei Rouanet e
artistas milionários, que chego a pensar em me tornar homem-arte, e passar a
explodir com cultura e informação os ingênuos ou energúmenos que propagam
disparates ao léu, sem medir as consequências.
Recentemente
retornamos da 1ª etapa do projeto SESC Amazônia das Artes, onde visitamos
algumas capitais de estados da Amazônia Legal – Palmas/TO, Porto Velho/RO, Boa
Vista/RR e Rio Branco/AC – e em agosto concluiremos a circulação de Velhos caem do céu como canivetes pelos outros estados da região amazônica – Manaus/AM,
Belém/PA, Macapá/AP, Cuiabá/TO e Teresina, no Piauí, que, apesar de não fazer
parte da região, é convidado por apresentar condições socioeconômicas parecidas.
"É a arte que nos ensina que não é necessário ter para ser, e que todo poder sucumbe perante uma forte onda de esclarecimento."
Só quem
passa por uma experiência similar a essa pode entender o significado de “custo
amazônico”, e a importância do conceito de Amazônia Legal para tentar
minimizar esse custo tão oprimente para os moradores da região, pois
permanecem distantes dos recursos públicos para desenvolver qualquer tipo de
atividade, incluindo as ligadas à cultura e arte. O projeto do SESC é inovador,
por entender esse custo e tentar diminuir as desigualdades de distribuição
artística na região, e favorecer a viabilização financeira do artista amazônico.
Por consequência,
ao conhecer e reconhecer o Brasil, depois de ter circulado pelo país inteiro
durante vinte anos, concluo que comentários sobre artistas ricos só podem sair
da boca de pessoas prostradas frete à TV e suas novelas, a imaginar que
artista é todo sujeito que aparece na sua frente à noite, na telinha, e
desconhecem profundamente seu país, onde 99% dos artistas são massacrados pela
escassez de recurso para poder produzir sua arte com dignidade.
O
Brasil é desigual por natureza, e o que o Ministério da Cultura tentou fazer
nos últimos anos foi minimizar essas desigualdades, e, ainda assim, não chegou
nem perto dessa tarefa na região que aqui coloco como exemplo. A penúria
financeira em que vivemos – sim, primeira pessoa do plural, porque o Maranhão
faz parte da Amazônia Legal – é digna de uma revolução, e a resistência
artístico-cultural é digna de elogio, e não de achincalhes. A prova de que somos
uma região suprimida pela invisibilidade, é o fato de, para os detratores,
sermos todos ricos.
Esse tipo
de comentário, no ouvido de um cidadão minimamente sério, soa como um chiste
equivocado, uma anedota nefasta, uma piada de mau gosto. Qualquer cidadão ligado
ao fazer cultural da sua cidade conhece as dificuldades em que se encontram
seus artistas, as lutas, as frustrações, mas, principalmente, a permanente
resistência. É a arte que nos ensina que não é necessário ter para ser, e que
todo poder sucumbe perante uma forte onda de esclarecimento.
Ou seja,
o valor que sobra para a arte não compromete a saúde do cidadão, não desfalca a
educação do aluno, não abala a segurança do país; o valor historicamente
destinado à cultura não passa daquela velha e famigerada esmola, aquela moedinha
que você joga no nosso chapéu depois de lhe dedicarmos duas longas e prazerosas
horas do nosso ofício. Não, a arte não vai falir o país. Não, 0,38% do
orçamento não vai comprometer o estado. Não, 90% das pessoas que aparecem na TV
não são artistas, como já falei aqui. Não. Não. Não. Pare de ser ingênuo ou mal-intencionado.
A cultura não precisa disso. Ela já tem moinhos suficientes que enfrentar, para
andar se preocupando com a sua desinformação.
5 comentários:
A nossa rebeldia é apresentar nossos espetáculo toda semana de forma gratuita e sem público.
Seguimos com nosso oficio de remar contra a maré da incompreenção destes que aí estão atravancando nosso caminho. Eles passarão. Nós passarinhos!
Com a licença poética de Mário Quintana.
Saber desse posicionamento artístico e político me orgulha, pois consigo identificar as marcas da nossa parceria nessas decisões. Resistir, sempre! É a única alternativa do artista!
Sim, 0,38% é para a Cultura, mas muito menos que isso chega às mãos dos artistas.
Sinto em mim a revolta que impulsiona seu texto.
João Vicente
Querido João! Saudades! Nosso encontro foi uma delícia! Esteja sempre aqui! Abraço!
Postar um comentário