"Eles passarão... Eu passarinho!" |
Hoje, dia 22 de março, faz 37 anos da
morte de Peregrina Jacinta Villani, minha mãe. Atendia pela alcunha de Pele,
mamá, tia, dependendo de quem lhe fizesse o chamado. Como eu tinha dez anos na
época, tudo o que advém da tentativa de escrever a respeito dela, não passa de memórias
ficcionais, lembranças inventadas, sensações. Em uma dessas recordações construídas
vejo minha mãe brincando de telequete com seus três filhos; vejo a tampa do
saleiro soltando da sua mão e salgando o macarrão no acampamento; vejo seu
desespero ao abrigar dois dos seus filhos em um toró fenomenal; vejo roupas
costuradas, pratos servidos, banhos dados, fardas passadas, carões e
gargalhadas. No mesmo lampejo de ficção, vejo a semelhança entre minha mãe e
Katia, quando a gargalhada se transforma em ataque de riso e, rindo sem parar, uma
mistura de gaitadas, lágrimas e urina consegue contagiar o mais amargo dos
seres.
Sou diretor de teatro, coisa que minha
mãe jamais imaginaria. Se estivesse viva, não creio que meu caminho fosse esse,
mas costumo idealizar que dela herdei a sensibilidade artística, tendo em vista
que meu pai é um homem mais pragmático. Ela morreu muito cedo, com 36 anos,
mais ou menos a idade que eu tinha quando fundamos a Pequena Companhia de
Teatro. Penso no que ela sonhou e não realizou. É como se tudo o que eu vivi de
lá para cá fosse o sonho de uma vida não vivida. Talvez por isso eu tenha
vivido a vida até aqui com a maior intensidade possível, por suspeitar que
somente este seja o principal mandamento da natureza humana. O que fazemos, o
que sentimos, o que vivemos. A efemeridade do teatro é a efemeridade da vida, e
a única maneira de marcar nossa passagem é vivendo, prazerosamente. O resto é
desejo ególatra de transcendência. Pois, como tudo passa, passaremos.
5 comentários:
O desejo e o egocentrismo estão sempre presentes na imanência e na transcendência. Ou seja, o desejo ególatra de transcendia é o mesmo desejo ególatra de vida. Beijo
*transcendência. :]
O maior mandamento é ser feliz, então acredito que acertaste ao escolher o caminho. Ela aplaudiria...
Desculpa a insensatez do primeiro comentário. Era eu sendo o idiota insensível que sou. Saudade não passa. Um dia o mundo sentirá saudade do mundo, saudade até da saudade. Um beijo, meu amigo. És quase como um pai para mim, no teatro, na cultura e na vida. Bjo
E o que foi que aconteceu, André? Não termino de entender o primeiro comentário e você já o desfaz com um segundo? Assim você queima minha cabeça! Tenha piedade de mim! (Risos) saudades!
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