Passei a semana refletindo
sobre o quanto o teatro consegue se descolar do rolo compressor imprimido pela
contemporaneidade, e no quanto ele contribui para a educação do cidadão, em
tempos onde gritos, pipocas, atrasos e ruídos fazem parte do cotidiano das
artes, seja no cinema, no show de música, na galeria de arte, no circo.
O teatro é templo de
pontualidade. Tolerância compreende, no máximo, quinze minutos. O espectador
chega pontualmente – a grande maioria – e entende que isso é necessário para a
melhor fruição da obra que vai assistir. Essa conquista é do teatro, tendo em
vista que esse mesmo espectador chega a um show de música com uma hora de
atraso, sabendo que vai entrar, e que o show ainda está longe de começar.
Qualquer espectador
minimamente acostumado com uma sala de teatro sabe que não entrará para ver um
espetáculo comendo ou bebendo, jamais. Essa conquista é do teatro, pois, esse
mesmo espectador vai ao cinema e se empanturra de pipoca e refrigerante, sem o
menor constrangimento.
O mesmo espectador do
parágrafo acima sabe que, após adentrar na sala onde acontecerá a apresentação
teatral, seu silêncio é o primeiro indício manifesto do respeito que ele tem pelos artistas em cena. Outra conquista do teatro, pois sabemos
que, o reiterado espectador, não só cochicha, como conversa e brada em qualquer
sala de cinema ou casa de show.
Hoje, em pleno século vinte
e um, qual é o único lugar onde se desliga o celular antes de entrar? Na peça de
teatro. E caso aconteça o indesejado esquecimento, corre-se o risco de que o
toque do celular gere a virada do pescoço e o olhar de toda a sala,
identificando em você o extraterrestre mais distante no espaço, ou o troglodita
mais distante no tempo.
São amenidades que tornam a
vida em coletivo mais afável, mais amável, mais sociável. São coisinhas sem
importância que transformam as pessoas e ajudam a construir o sentido de
cordialidade, boa educação, respeito. Pontualidade, assiduidade, atenção,
reconhecimento, são predicados importantes na constituição do cidadão, e o
teatro, com a parcimônia que lhe é particular, contribui para robustecer esses sentidos
no imaginário das pessoas.
Sim, de fato, é sobre essa
grande bobagem que eu estendo minha reflexão hoje. Um assunto menor, anódino,
entediante: educação. Algo fora dos holofotes, mas que fundamenta meu esforço
recente em explicitar a importância do teatro na vida das pessoas.
Percebam que a peça nem
começou ainda. Tudo o que advém da cena
quando a cortina se abre é reconhecidamente construtor de dizeres que formam,
esclarecem, questionam, contestam. Minha defesa hoje é mais sutil. Apenas
destaco aqui a ação efetiva de formação cidadã que o teatro oferece antes mesmo
do espetáculo começar – lembrando que, no teatro, antes da cortina se abrir,
temos o nada. O teatro tem esse poder. Só ele pode fazer do nada um espaço de
ensinamentos para a vida toda.