Uma companhia
de teatro é uma estrutura orgânica. É argilosa, pulsa, se modifica, vive. Por
muito tempo acreditei no contrário, e apostei todas as minhas fichas na rigidez
das pedras. Hoje entendo que um organismo precisa respirar, e tudo o que dele
emana é frutífero, sempre e quando seus fundamentos sejam respeitados. A
pulsação de uma companhia está diretamente relacionada à pulsação dos seus
membros, e suas conquistas tem a mesma relação progressiva. No final da década
de oitenta e início dos noventa – quando morava no interior do estado – vivi
algumas das experiências mais significativas da minha vida no que se refere à
vida em coletivo. Na época, sonhávamos juntos exatamente aquilo que
conquistamos hoje, individualmente. De lá para cá, algo se perdeu. O indivíduo
se sobrepôs ao todo, e estamos repletos de coletivos que reúnem indivíduos
ilhados, entupidos de companhias de um homem só, entulhados de grupos que não
se agrupam, de companhias sem unidade no discurso, de artistas migratórios que
saltam de coletivo em coletivo, de grupos que são apenas um selo, de CNPJs de
aluguel – tudo com o argumento de preservar o indivíduo. Esses defensores
esquecem que o neoliberalismo dos anos noventa se encarregou, não só de preservar,
mas de impregnar o individualismo em toda a sociedade. Os grupos que resistem
dentro de padrões mínimos de convívio coletivo, de confronto dialético, de efetiva
socialização, foram, são e serão o esteio do teatro brasileiro. Quando aqui me
contradigo, ao defender a argilosidade necessária para a existência de um grupo
de teatro, e ao criticar a pluralidade pulsante nos formatos dos coletivos
contemporâneos, é para compartir com o leitor meu questionamento atual, e a
reflexão que dele provém. O ato teatral, de fato, na sua essência, pode
acontecer na solidão do indivíduo, mesmo que pareça acompanhado?
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6 comentários:
Bom dia.este comentário feito caiu muito bem como carapuça na minha cabeça pois sei que os grupos e companhias existentes tem esse formato descrito por você.Parabéns pela sua insistência para que o teatro VIVA.Estou com saudades muitas....Beijos.
Saudades, Tony! Estou esperando vocês, viu?
O teatro se chamava Amador, Flecha. Agora, essa palavra é xingamento! Virou Teatro de Grupo (até aí, nenhum problema), e a ideia de fazer por amor deu lugar ao "profissionalismo", assim, entre aspas, porque a grande maioria sobrevive em condições abaixo do mínimo razoável... Ainda assim, todos estamos atolados em nossos editais e projetos, e assim não conseguimos mais nos articular para pensar e recriar essas nossas formas de convivência... Enfim, aguante!
Salve, Fernando! Saudades de você por aqui. De fato. Agora, precisamos parir esse espaço para a articulação, sob pena de terminarmos exauridos de tanto teimar. Apareça mais!
Particularmente ando perdido entre conceitos sobre "grupo", "companhia", "coletivo", etc. Digo perdido, porque tenho encontrado conceitos que não condizem com as reais condições ou realidades exercitadas. Ou seja, grupos que parecem coletivos,ou coletivos que convivem como companhia e assim por diante. Na verdade, a mim, o formato pouco importa, desde que o "compartilhar" não se perca dentro de um trabalho artístico. Isso o "amador" ou o "profissional" podem fazer. Mas sinto falta de conviver sem a preocupação com o sustento da "turma". Como Fernando, sinto-me um pouco atolado por tantos projetos e a tranquilidade para repensar comportamentos, inclusive este questionamento do Marcelo, começam a ficar escassos. É... temos que repensar...
Isso é que é um homem de palavra! Disse que apareceria aqui, ainda agorinha, e já apareceu! Vamos prosear, João!
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