domingo, 13 de outubro de 2013

Para as pequenas...

(Pequena Companhia de Teatro e Petite Mort Teatro).
 
Foto de Ayrton Valle
 
Como dois e dois a teatralidade movimenta a cena local

Como num "tempo de alegria, como dois e dois são quatro, sei que a arte vale a pena, mesmo que o pão seja caro e a liberdade pequena". Com esses versos de Ferreira Gullar, referencio dois acontecimentos, duas estreias, dois atores, dois diretores, dois dramaturgos, duas obras.

Em meio à realização da calorosa e bem sucedida edição da Feira do Livro, 2013, duas grandes estreias marcaram a cena teatral: Dona Derrisão, do Petite Mort Teatro e Velhos Caem do Céu como Canivetes, da Pequena Companhia de Teatro.
Com dramaturgia original, ambas escritas pelos próprios dramaturgos-diretores dos espetáculos, Igor Nascimento e Marcelo Flecha, a temática, falas e diálogos, inspiradas em contos, cotidiano e inspirações diversas, reverberam no público, que reage seja com um sorriso de identificação da causa, seja com associação de imagens mentais que relacionam a voz poética dos atores com fatos reais e luta diária pela sobrevivência, pela valorização da arte, pelo respeito ao outro, pela criação de um sentido para a vida e principalmente, pela aceitação de um fim, de uma inevitável morte como etapa da vida.
Assim compactuam Igor Nascimento e Marcelo Flecha nas suas mais recentes inaugurações. Os dois diretores – dramaturgos colocam em cena dois atores que fazem uso de uma poética do corpo e da voz, através da construção de uma corporeidade teatral fundada nos opostos, contenção e expansão, vigor e suavidade, que na pesquisa da Pequena Companhia segue o caminho dos antagonismos como procedimento criativo e na Petite Mort, dos afastamentos e aproximações.
Dois atores dialogam entre si. Em Velhos Caem do Céu como canivetes, os diálogos concentram-se entre os dois personagens, o humano e o alado, sem falas diretas para a plateia que assiste a tudo pelo “buraco da fechadura”. Em Dona Derrisão, os diálogos são compartilhados com o público, na proposta de aproximação e deslocamento por meio dos personagens variados, velho, pop star, velha, paciente, médico, outro, através do jogo de revezamento do ator narrador.
A plasticidade em cena cria uma justaposição do real com o teatral por meio dos elementos utilizados para compor o cenário nos dois espetáculos, fazendo uso da exploração dos elementos da luz, como cor, direção e intensidade assim como da ressignificação de objetos utilitários, domésticos e cotidianos. O ambiente domiciliar e secreto, no espaço íntimo do mendigo, artista e humano, em Velhos Caem do Céu como Canivetes, se contrapõe ao ambiente público, cheios de interrupções, ruídos e interferências da parada de ônibus, em Dona Derrisão.
Diante da teatralidade visual, textual e expressiva, agradeço a essas companhias (Pequena Companhia de Teatro e Petite Mort Teatro), por movimentar um tempo de alegria, um tempo quando a arte vale a pena, mesmo que o pão seja caro e a liberdade Pequena/Petite.
 Gisele Vasconcelos
 

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