(Pequena Companhia de Teatro e Petite Mort Teatro).
Foto de Ayrton Valle |
Como num "tempo de alegria, como dois e
dois são quatro, sei que a arte vale a pena, mesmo que o pão seja caro e a
liberdade pequena". Com esses versos de Ferreira Gullar, referencio dois
acontecimentos, duas estreias, dois atores, dois diretores, dois dramaturgos,
duas obras.
Em meio à realização da calorosa e bem
sucedida edição da Feira do Livro, 2013, duas grandes estreias marcaram a cena
teatral: Dona Derrisão, do Petite Mort Teatro e Velhos Caem do Céu como
Canivetes, da Pequena Companhia de Teatro.
Com dramaturgia original, ambas escritas pelos
próprios dramaturgos-diretores dos espetáculos, Igor Nascimento e Marcelo
Flecha, a temática, falas e diálogos, inspiradas em contos, cotidiano e
inspirações diversas, reverberam no público, que reage seja com um sorriso de
identificação da causa, seja com associação de imagens mentais que relacionam a
voz poética dos atores com fatos reais e luta diária pela sobrevivência, pela
valorização da arte, pelo respeito ao outro, pela criação de um sentido para a vida
e principalmente, pela aceitação de um fim, de uma inevitável morte como etapa
da vida.
Assim compactuam Igor Nascimento e Marcelo
Flecha nas suas mais recentes inaugurações. Os dois diretores – dramaturgos
colocam em cena dois atores que fazem uso de uma poética do corpo e da voz,
através da construção de uma corporeidade teatral fundada nos opostos,
contenção e expansão, vigor e suavidade, que na pesquisa da Pequena Companhia
segue o caminho dos antagonismos como procedimento criativo e na Petite Mort,
dos afastamentos e aproximações.
Dois atores dialogam entre si. Em Velhos Caem
do Céu como canivetes, os diálogos concentram-se entre os dois personagens, o
humano e o alado, sem falas diretas para a plateia que assiste a tudo pelo
“buraco da fechadura”. Em Dona Derrisão, os diálogos são compartilhados com o
público, na proposta de aproximação e deslocamento por meio dos personagens
variados, velho, pop star, velha, paciente, médico, outro, através do jogo de
revezamento do ator narrador.
A plasticidade em cena cria uma justaposição
do real com o teatral por meio dos elementos utilizados para compor o cenário
nos dois espetáculos, fazendo uso da exploração dos elementos da luz, como cor,
direção e intensidade assim como da ressignificação de objetos utilitários,
domésticos e cotidianos. O ambiente domiciliar e secreto, no espaço íntimo do
mendigo, artista e humano, em Velhos Caem do Céu como Canivetes, se contrapõe
ao ambiente público, cheios de interrupções, ruídos e interferências da parada
de ônibus, em Dona Derrisão.
Diante da teatralidade visual, textual e
expressiva, agradeço a essas companhias (Pequena Companhia de Teatro e Petite
Mort Teatro), por movimentar um tempo de alegria, um tempo quando a arte vale a
pena, mesmo que o pão seja caro e a liberdade Pequena/Petite.
Gisele Vasconcelos
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