domingo, 16 de outubro de 2011

O espaço como instrumento de dramaturgia

Fui convidado para participar de uma mesa que vai discutir “Espaço em Foco – O Protagonista da Cena Cultural”, na 6ª Mostra SESC Guajajara de Artes, e vou concentrar meu argumento no poder dramatúrgico que a espacialidade exerce sobre a obra teatral. A investigação espacial sempre foi objeto do meu processo criativo e já transitei da rua para o palco, do alternativo para o clássico, da arena para o italiano, desenvolvendo uma análise sobre o espaço cênico, que culmina com a última experiência da pequena, quando Pai & Filho se apresenta como receptor de quase todas as alternativas citadas.

Portanto, a apreciação que aqui faço não trata da qualidade do espaço, e sim da relação palco-plateia arguindo a encenação e dotando-a de maior potencial dramatúrgico. A posição do espectador em relação à cena é instrumento de discurso, consequentemente, possuidor de conteúdo. Quando convidamos o espectador a circundar a cena em O Acompanhamento ou em Deus Danado, estamos reforçando um conteúdo, buscando uma relação de diálogo – constrangedor, incômodo e inconveniente no primeiro, e sufocante, dolorido e angustiante no segundo. Em Pai & Filho, quando a partir da porta abre-se a perspectiva até atingir a plateia, procura-se trazer o espectador para dentro do conflito, reforçando a percepção de confinamento – esteja montado em espaço alternativo ou clássico.

A opção do espaço, a distribuição da plateia, a pesquisa de ambiência não deve ser tratada como um modismo, uma alternativa de distinção ou uma opção revolucionária ou contestadora de padrões – seria mera perfumaria. Essa necessidade precisa ser demandada pela encenação, qualificando seus dizeres, redefinindo seus caminhos e complementando o discurso. Caso contrário, levar uma peça para dentro de um ônibus, de um contêiner ou colocar o espectador no palco sentado em uma samambaia, não passará de mera pirotecnia – a cosmética do espaço.

2 comentários:

Fernando Bicudo disse...

Perfeito o seu comentário, Flecha.
Não nos esqueçamos que para as grandes montagens produzidas pela Ruth Escobar, nos anos 60 em São Paulo e que ficaram marcadas como entre as mais importantes de nossa história, "O Cemitério dos Automóveis", de arabal, e "O Balcão", de Genet, ela construiu espaços cênicos inéditos, inusitados, com a distribuição do público em platéia formadas por assentos em interior de carros em um amontoado de carros ou por uma estrutura metálica em formato de um gigantesco silo... genial!

Marcelo Flecha disse...

Ciao, Bello! Um espectador que esteve nessas duas plateias, como você esteve, tem propriedade e mata este pobre infeliz de inveja!! rsrrsrs... É sempre uma alegria ler seus comentários aqui, apareça!