domingo, 28 de agosto de 2011

Diário de Teresina

Na oficina

26/08/11. Sexta, 2:30 AM

Teresina nos recebe com um grupo interessante de participantes da nossa oficina. O nível surpreendeu e o rendimento dos inscritos possibilitou um bom resultado. Falta saber quantos restarão amanhã, depois de terem provado quatro horas de treinamento intenso. Prometo contar. À noite o espetáculo. Casa cheia. FestLuso. Acho que o horário de 23:00 horas afetou a energia, mas os debates sempre contestam minhas impressões... as pessoas são condescendentes com nossas falhas, pelo menos na nossa frente (risos). Depois, uma das melhores partes, os quatro no quarto de hotel, rindo de nós mesmos.

28/08/11. Domingo, 2:12 AM

Pulo no tempo. Já passaram as duas outras apresentações, as duas últimas jornadas da oficina e a reunião com os diretores. Missão cumprida e comprida. O saldo final nos regozija. Gente voltando da porta na última apresentação, as baixas na oficina foram muito poucas, e o encontro com os diretores, sempre um papo informal e agradável. O FestLuso é um espaço onde me sinto bem. Talvez pela proximidade com os organizadores, amigos que tornam o encontro algo mais do que ofício. Sobram as impressões sobre o espetáculo: seis apresentações em cinco dias e oscilações de energia, ritmo e modulação a serem observadas. Contudo, o espetáculo ganhou em contundência. Fim da primeira jornada de Circulação de Pai & Filho pelo Myriam Muniz. Ainda faltam cinco.



Nas alturas

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

A aceitação de estranhos

Não preciso de ninguém, sou autosuficiente, quero ter minha independência. O teatro me demonstrou o contrário. Vaia de bêbado não vale, já dizia o dissonante Tom Zé. Aplausos de amigos também não. Sobram-nos os desconhecidos, os estranhos às vistas. Desses preciso de acolhimento, já que nesses casos sinto-me como um corpo estranho no ninho/útero. 
Oficina em Teresina

Quero saber como estou no palco, e os aplausos não me satisfazem por completo. Nem palavras elogiosas. Elas não funcionam para a necessidade de aceitação que preciso. Ir além do que as próprias asas limitam. Há uma dor em se sentir no vazio, distante de algo que ainda não sei ao certo - reconhecimento pelo trabalho que desenvolvo ou por mera carência.

Primeira apresentação em Teresina


Espero a aproximação daqueles que me olham à distância. Sei que deixamos marcas naqueles que nos observam, nos tocam, são acariciados por nós - qualquer tipo de carinho é possível, é provável. Quero dizer que eu também sou marcado por aqueles que somente espectam. A energia se desloca no espaço, modula a minha em cena. Depois de cada sessão, nunca sou o mesmo que a principiou. O quarto do hotel é um excelente abrigo.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Diário de Timon (2ª parte)

24/08/11. Quarta, 1:44 AM

Segunda apresentação em Timon e a sensação de uma boa oxigenada para Pai & Filho. O exercício de apresentar-se seguidamente possibilita a percepção imediata das referências e um dia é a consequência do dia anterior. Constatação de que 90% dos espectadores nunca tinham visto um espetáculo teatral. Em Riachão o índice foi o mesmo. Sintoma da distância entre nosso desejo e a realidade de um estado sempre à margem. Estado de excluídos. No final da noite, agora em Teresina, o lançamento do meu livro (aquele de que tanto falei aqui) que faz parte da programação do FestLuso. Um exemplar cruzará o oceano e pousará em Luanda, Angola. Abraço nos amigos d’A Outra Companhia de Teatro da Bahia, presentes no Festival, e saída à francesa para uma taça de vinho no quarto do hotel. Jorge, Cláudio e a deliciosa crise de riso de Katia. Não tenho do que reclamar.

24/08/11. Quarta, 23:19 PM

Fim de cena em Timon. Bom espetáculo, mais intenso, mais vivo. Nosso desafio agora está na excelência. Pai & Filho deverá atingir aquele ponto que distingue uns de outros e essa busca é o desafio permanente da pequena. Casa cheia, debate animado e a clareza de estar contribuindo, de algum modo, para a transformação. Chamem-me romântico, que seja! Cresci acreditando nisso e levo décadas de derrotas nas costa. Vitórias chegarão. Agora mesmo, acabamos de desmontar em Timon e vamos montar em Teresina enquanto bebemos para relaxar. Nosso descanso é carregar pedras. Que venham!

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Diário de Timon

21/08/11. Domingo, 23:00 PM.

Cheguei do Rio esta madrugada, com dois prêmios para Pai & Filho na bagagem (Texto e Cenografia). No mesmo domingo já estava dirigindo rumo a Timon e Teresina (Myriam Muniz e FestLuso). Comigo, os de sempre: Jorge, Cláudio e Katia, que voltaram do Rio antes de mim. A ideia era montar ainda hoje em Timon, mas problemas com a produção postergaram a jornada. Amanhã montagem, oficina e espetáculo. Viagem tranquila, tempo para pôr o papo em dia e Teresina se apresenta. Hospedagem, jantar e cama. Amanhã o dia promete.

22/08/11. Segunda, 23:00 PM.

Montagem recorde: duas horas. Primeira montagem diagonal em sala alternativa para otimizar o espaço. Problemas de quórum adiaram o início da oficina... coisas de circular. Tempinho para um descanso e hora da primeira apresentação de Pai & Filho pelo projeto Myriam Muniz de Circulação. Timon inaugural. Fora alguns momentos de frieza, a apresentação aconteceu mais descomprometida. Às vezes me levo exageradamente a sério e, o burocrata, acaba sendo eu. O exercício de nos apresentar seis vezes em cinco dias será importante. Hospedados em Teresina, a possibilidade de rever Pellé e amigos de outros FestLusos. Cansado, vou-me.

sábado, 20 de agosto de 2011

Pai & Filho em Timon

A circulação do espetáculo Pai & Filho começa em Timon, nos dias 22, 23 e 24 de agosto (segunda, terça e quarta-feira), às 20h, na Microlins (Av. Pres. Médici, 835). A oficina ocorrerá nos mesmos dias, das 14 às 18h, na Faculdade Maranhense São José dos Cocais (Rua 1, 290).

O apoio local é da Microlins, Faculdade Maranhense São José dos Cocais, Prof. André Loiola, e Libomir Coutinho.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Assim é teatro de grupo

Grupos de teatro são quase todos iguais, mesmo em suas diferenças. São feitos por humanos - dizem -, constam de diretores, atores, produtores. Muitas ou poucas pessoas. Algumas sedes e muitas atividades dentro e fora do palco. Algumas incontingências, muitos planejamentos, projetos, dinheiro ou não-dinheiro para financiamento dos sonhos que se tornarão espetáculos premiados e aplaudidos ou não. Todos são muito semelhantes. Todos querem seu próprio espaço de criação e mostragem. 

Algumas experiências demonstraram que a administração desses espaços carece de gente especializada e tempo para geri-lo. Quando não, a produção e pesquisa do grupo residente cai assustadoramente. Tornam-se burocratas do seu próprio espaço para a ocupação dos outros. Aluguel, água, telefone, burocracia, responsabilidades outras.

Não acredito em sorte ou azar, nem em bem ou mal. Acredito na capacidade de reflexão, análise e posição que fazem com que as escolhas sejam coerentes com o propósito para o qual elas se destinam. Por outro lado, a perdição é temporariamente uma excelente... escolha. Percorre nos instantes, nos minutos e horas que me separam do possível treinamento marcado e da prova de um material gráfico que não ficará pronto como planejado. 

Relaxar e escrever, pensar na notícia requentada que será servida como fresca, lembrar do gosto do vinho por sorver e esperar a nova rotina que se avizinha: viajar sem gaiolas e com o peito aberto. A alegria de comer a omelete reside em quebrar os ovos e desistir da salsicha. Scooby Doo, cadê você, meu filho?!

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Entrevista

Marcelo: O que você está achando do Festival de Teatro do Rio?
Flecha: Minhas impressões não são conclusivas, mas é um festival simpático.
Marcelo: E a apresentação de Pai & Filho?
Flecha: Foi caoticamente harmoniosa. A receptividade do público me surpreendeu, riram muito. Só o Rio de Janeiro para querer transformar Pai & Filho em uma comédia. Depois da apresentação, comentários calorosos, elogios, e a certeza de estar fazendo teatro de qualidade.
Marcelo: Por que a roda gira?
Flecha: Porque não é quadrada.
Marcelo: Durante o debate você enrolava um novelo de linha, por quê?
Flecha: Para adiantar a desmontagem. O debate foi mediado por Amir Haddad. Sua condução monologal me permitia enrolar enquanto ouvia. Depois, com a interferência de Cláudio e as perguntas dos espectadores, pude dialogar. O público foi muito generoso, mas continuo sentindo falta de discutir o processo mais a fundo.
Marcelo: E sobre os outros espetáculos?
Flecha: Estou vendo todos, nenhum que me arrebatasse, ainda. Acho que estou cada vez mais ranzinza e mal humorado. A Casa de Cultura Laura Alvim, sim, uma delícia. E Ipanema é muito agradável.
Marcelo: Qual a falta que não falta?
Flecha: De vergonha.
Marcelo: Qual a sua opinião sobre o fato do festival ser competitivo?
Flecha: Todos são. Na contemporaneidade estamos sempre competindo e consumindo, infelizmente. Nas mostras não competitivas, a disputa é apenas mais sutil.
Marcelo: Por quê?
Flecha: Por quê?
Marcelo: Você é um entrevistado insuportável, nunca pensou em se matar?
Flecha: Pensei, logo, desisti.
Marcelo: ... que pena.

domingo, 14 de agosto de 2011

Mando notícias do lado de cá

Sãos e salvos, nunca. Sempre haverá uma ferida a ser cicatrizada. Correr riscos é nosso ofício. Pessoas em um palco, às vistas, requerem bem mais além de talento e fé em seus próprios tacos.
Nunca é somente mais um festival. Sempre buscamos a superação de tudo: performance, extrato de conta bancária, limite de cartão de crédito, relacionamentos. Tudo minuciosamente anotado em uma agenda. A busca não é segura, nunca. Deslizes serão sempre presentes. O risco de fugir ao controle é iminente, quase sempre. E sabemos disso e daquilo, mas insistimos em ver a felicidade na perda do controle: estamos vivos.
É que além do horizonte há sempre uma chance de um recomeço, nunca do ponto em que se parou, nunca acumulando coisas, nunca sofrendo, mas vivendo intensamente as escolhas feitas, quer na vida, quer nos palcos. As relações entre ambas serão risíveis na maior parte do tempo. A verdade é feliz. A mentira, idem. Esse duplo nos acompanha tanto em uma quanto em outra.


E quem disse que a vida não se eterniza?

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

E Cazuza tinha razão

Lidar com um teatro de energias requer um corpo pronto. A capacidade de armazenamento de informações está diretamente relacionada à disposição e prontidão do corpo que anteriormente vivenciou, experienciou a construção de uma personagem em sala de ensaio. Se o corpo deixa de estar pronto, a personagem se distancia, não por falta de memória corporal, mas por limitações físicas de um corpo que se ausentou de suas atividades diárias. O nível de exigência em um treinamento para a construção de um espetáculo deve ter seus critérios contaminados na manutenção das ações cênicas. É aquela velha história de que o espetáculo não se esgota – em nível de ensaios – na estreia. A frequência dos encontros entre os atores e a direção deve ser permanente, como é permanente o respirar, o comer, o vestir. Quando isso se altera numa perspectiva de descontinuidade, as consequências não são nada interessantes para a recuperação de uma aproximação daquilo que se estabeleceu como razoável para a permanência das personagens na ação vívida da cena. Sabemos que o teatro é efêmero, mas o mínimo de definição e continuidade permaneceriam... naquilo que se propôs, o ator, consciente disso, lida com as incontinências do cargo: viver é morrer diariamente um pouco. E teatro ainda é drama, e ator-dramático-capricorniano-ansioso-confesso sofre com as palavras ditas e as não-ditas; com a falência do corpo e com a sonolência dos passos.

Acho que é lenda urbana, mas dizem os seres alados que sobrevoam as catedrais góticas da Finlândia, que existe um patrício de Mara e Dona que de tão neurótico contava macarrões para serem cozidos, ao dente, e distribuídos em pequenas porções em coités piauienses, para os desabrigados dos teatros do Maranhão. Minha neura maior está na fragilidade permanente do corpo adormecido pela incapacidade do uso. 

domingo, 7 de agosto de 2011

Tripla jornada



Enquanto a pequena prepara sua apresentação no 18° Festival de Teatro do Rio, dia 13, 21:00h, no Teatro Laura Alvim, em Ipanema, confirma sua participação no FestLuso 2011 – Festival de Teatro Lusófono, promovido pelo querido Grupo Harém. Será o primeiro festival internacional de Pai & Filho.

O semestre começa com esses dois eventos e com o início do projeto de circulação, em Timon e Teresina, confirmando a impecável carreira do espetáculo até aqui.

Mantendo a prática deste blog, Cláudio Marconcine e Marcelo Flecha se encarregarão de escrever o diário desta jornada tripla.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A memória dos outros

Memória se relaciona com conhecimento. Ao colocarmos em cena alguma ação física, ela repercute nos outros, através da memória, algo que não é indiferente àquele que vê. É que memórias se encontram, independente do tempo ou da geografia. Os encontros apaixonados são feitos de memórias acumuladas resgatadas sem pudores. Uma nação é feita de memórias. A minha, a sua, a do outro. A memória do outro passa a ser a sua quando é compartilhada. O corpo tem memória. Ele fala em gestos aquilo que sentiu. O ator, encenador e seu público têm uma memória coletiva. Em algum momento elas se encontram. Alguns espetáculos lidam melhor com isso; outros não. Boas ou ruins, as memórias nos fazem perceber que não estamos sós. As conexões sempre nos fazem próximos àquilo que se apresenta no palco. 

O que fazemos com nossas memórias?