quinta-feira, 6 de maio de 2010

Encenação de identidades

Buenos Aires. Estou aqui. Atrasado de novo. Segunda que vem de volta a São Luís. Espero normalizar minhas postagens. Discuto com minha irmã, a psicanalista Silvia Flecha: arte e psicanálise. Minha sobrinha resmunga pedindo atenção – para quatro meses de vida o assunto parece enfadonho. Na pauta um e-mail do Hamilton, fiel amigo da pequena companhia de teatro. Penso: se é pertinente para uma psicanalista portenha será para nossos múltiplos leitores. Peço autorização para publicar. Quem cala consente.
Katia Lopes por Hamilton Oliveira
Eis o dito:

“Como espectador das produções da Pequena Cia me sinto às vezes na berlinda. Em parte, creio eu, porque os espetáculos me fazem questionar meus valores culturais de auto-identificação (o que sou vivendo essas experiências singulares aqui nesse lugar).

Na cena de Pai e Filho tudo se desmonta e se remonta a partir dos usos. A manipulação da linguagem transforma os objetos. Me incomoda, na condição de espectador, que os significados não são permanentes, eles são relacionados aos jogos, às atribuições entre os personagens. Cada posição (manifestação) é um ato para marcar o lugar (passagem entre lugares na cena) do outro. E nessa ação, cada coisa pode ganhar significados a cada novo momento vivido, a cada novo diálogo, a cada novo esforço de auto-realização de nós personagens (a platéia é personagem - mesmo que, para Gilberto, no Pequeno Teatro ela seja um personagem rejeitado). Em Pai e Filho, se vejo um pedestal, noutro instante aquilo já é um trampolim! Está tudo flutuando, o material não é a referência fixa para entender o mundo, no fundo é um espaço cênico sem chão (Jorge diz). As intencionalidades são desestabilizadas a cada instante antes mesmo de serem fixadas, de representarem alguma convicção de qualquer personagem.

A encenação de Marcelo me deixa atento, me faz observar que nas superfícies tem-se a impressão das permanências, das constâncias sacralmente inalteradas, das tradições, mas são só impressões que logo se desfazem... nas profundezas, sente-se/vive-se realmente os dramas em que as identidades culturais são inventadas e encenadas sem chão, sem fixidez, diluídas... e isso é um perigo, por isso às vezes corro apressado para tentar ancorar identidades em territórios de significados que atribuo a tudo e a todos (pelo menos temporariamente)... e louvo esses territórios, crio meus próprios símbolos... até que não me contento e vejo que dá para desmontar e remontar tudo de novo... a encenação desses rituais muda sempre. ”
Hamilton Oliveira

5 comentários:

Cordão de Teatro disse...

"...não dá para fechar em um único pensar, em uma única escola. Um teatro pequeno e múltiplo, talvez."

Sempre me sinto perturbado com tantas classificações e respostas que "todos" querem ter. Eu nunca acho resposta, eu busco as dúvidas, eu busco minha propria confusão. Bom, não tenho escola, sou analfabeto. Vejo os espetáculo da Pequena Cia. e isso me basta em muitos aspectos, são sinceros, são fortes, são verdadeiros, eles não mentem, marcelo não permite mentiras em seu teatro, eu amo isso.

xico cruz

Cláudio Marconcine disse...

acredito em tudo o que hamilton escreve. até em seu silèncio. por isso ainda não consigo me identificar com nada. sou como o cenáro do espetáculo... e de quebra adoro vinho.

Adriano De Lavor disse...

OI, amigo.
Por acaso sua irmã estudou em Fortaleza, nos anos 80? Se for ela, gostaria de ter o contato dela. Fizemos dança juntos! Abraço!

Adriano De Lavor disse...

OI, amigo.
Por acaso sua irmã estudou em Fortaleza, nos anos 80? Se for ela, gostaria de ter o contato dela. Fizemos dança juntos! Abraço!

Marcelo Flecha disse...

Sim Adriano, efetivamente minha irmã estudou em Fortaleza nos anos 80. Me manda um e-mail e lhe dou o contato. marceloenriqueflecha@hotmail.com