quinta-feira, 13 de maio de 2010

E no sétimo dia descansou

São Luís. Estou aqui. Atrasados de novo. Cheguei e não consegui normalizar minhas postagens. Não cheguei a tempo – a mentira tem poder de verdade, mesmo quando não se faz verdade. Mas vamos ao que interessa: teatro é trabalho? Ser artista implica quase que cotidianamente numa insatisfação latente que às vezes nos cega para a nossa própria realidade. Digo isto porque hoje me sinto um felizardo. Fazendo teatro não tenho horário. Não bato ponto. Durmo quando quero. Acordo quando quero. Há muitos anos não sei o que é obrigação formal. Faço o que gosto. No horário que gosto. Com quem gosto. Sou ranzinza porque gosto, não sei ser de outra maneira, mas não significa que a insatisfação que sinto fazendo teatro seja ruim. Ela é minha vida. E minha vida é boa. Em outros momentos vocês leram minhas queixas, mas hoje destaco minha sorte. Até sobrevivo disso: teatro. Por isso me pergunto: é trabalho? Creio haver encontrado, já faz algum tempo, a maneira de viver sem trabalhar – se levo em conta o peso social, formal e sacrifical que a palavra trabalho carrega. O trabalho no teatro é substituído pela possibilidade de manipular o nosso entorno para transformá-lo. Nosso trabalho é lidar com o ser sem exigências de concretude. Podemos chamar isso de trabalho? Evidentemente meu bom humor não durará para sempre, e amanhã estarei dizendo cobras e lagartos desta dolorosamente doce atividade, mas hoje estou assim. “E hoje não é hoje?” perguntaria o Pai do espetáculo Pai e Filho. É.
Homem trabalhando, por Hamilton Oliveira

3 comentários:

Silvia Flecha disse...

Gostei da pergunta...o conceito de trabalho como do operário que bate ponto é nascido na Era Moderna, nos inícios do capitalismo...o conceito de trabalho como sacrifício, também tem sua data de nascimento, pertence ao pensamento judeu-cristao, e deve supor um Deus-PAI-todo poderoso para quem se realiza dito sacrifício...a queda do deus-PAI tal vez permita descansar tranquilio.
¡Quanto vc tem trabalhado com esse seu Pai e Filho!

Cláudio Marconcine disse...

credito o meu teatro ao meu prazer. odeio trabalhar. gosto de ensaiar, não gosto de apresentar. ambos dão trabalho, mas um é mais prazeroso que outro. isso não me faz um péssimo ser/ator/humano.

dia desses percebe que minto: fico dizendo por aí que sobrevivo de teatro e isso não é verdade. aqui, por exemplo, estou ganhando dinheiro desenvolvendo um projeto de artes visuais. um outro, vai ser em contação de histórias. outro, em clown. e cadê o teatro. marcelo não vive de teatro. ele acha que vive. ele vive porque respira o que quer respirar, e não é só teatro, não.

e quanto à sorte, lamento informar: ela não existe.

Marcelo Flecha disse...

você descobriu que é mentiroso e quer me levar junto? Vade retro!!